Gestão na advocacia

Vale a pena entrar com um processo?

Vídeo descritivo sobre o entrar com um processo no Brasil em da ADVBOX sobre Direito, Tecnologia e Gestão.

Clique para assistir o episódio no Youtube, mas se preferir, segue o roteiro…

Decisão de entrar na justiça

Vale a pena entrar com um processo?

Hoje iremos falar apenas de ações com interesse financeiro. Seja qual for o motivo, é preciso deixar a emoção de lado e pensar com clareza.

Juristas dizem que uma pessoa pode procurar o Poder Judiciário quando tem um direito ferido. Todavia, isso não é uma explicação suficiente.

A teoria econômica das escolhas racionais diz que as pessoas e empresas irão decidir de forma racional para aumentar seus ganhos e diminuir os custos. Portanto, se uma pessoa quer cobrar na justiça R$ 1.000,00, mas para mover o processo irá gastar R$ 1.500,00, racionalmente não irá fazer sentido.

À vista disso, muita gente defende que se aumente os custos para entrar na justiça brasileira. Esse é o fundamento para criticar a existência da Assistência Judiciária Gratuita e até mesmo da Defensoria Pública.

Os defensores dessa ideia alegam que são os contribuintes que estão pagando para uma pessoa entrar com uma ação judicial e isso é injusto. Contudo, nossa Constituição garante o acesso à justiça para todos e não apenas para quem possa pagar.

Normalmente, há quatro motivações contrárias para uma pessoa não entrar na justiça.

Não entrar na justiça

O primeiro motivo fica por conta da demora de um processo judicial. Segundo, os custos do processo pagos para o Tribunal. Terceiro, os honorários do advogado que terá que pagar. Por fim, o quarto motivo diz respeito ao risco de perder a ação, pois toda ação judicial é uma caixinha de surpresas e por questões processuais muitas vezes é definida em favor do devedor.

Estes são os chamados Custos Sociais do Litígio para o autor da ação. Sintetizando, podemos definir que mesmo ganhando, haverá algum prejuízo. Exemplo: Possuindo o direito de receber R$ 10.000,00 essa pessoa já teria um prejuízo de 33%. Isso porque 20% são para honorários, mais R$ 1.000,00 de taxas judiciais e mais R$ 300,00 do seu próprio tempo despendido.

Além disso, é de praxe se estimar que o risco merece uma redução de 30% no valor de eventual acordo.

Por fim, é preciso colocar na ponta do lápis o envolvimento psicológico, emocional e energia investidos no litígio.

A recomendação é que se inicie com a expectativa de conseguir 60% do valor da dívida para se pensar um acordo antes de começar o processo judicial.

Princípio do livre convencimento do Juiz

O princípio do livre convencimento do Juiz é uma regra brasileira que não é comum em outros países. Esta regra permite uma variação muito grande nas decisões.

Sabendo disso, muitos advogados ingressam na justiça com todos os argumentos possíveis para aumentar o valor de R$ 10.000,00 para R$ 20.000,00, por exemplo, mesmo com quase nenhuma chance de conseguir.

É fácil para o advogado convencer o cliente, inclusive sugerindo o direito à indenização ainda maior que a dívida, tendo em vista que o cliente vê a situação a partir dos seus interesses.

Sejamos realistas: atualmente qualquer ação pode render 2 ou 3 vezes mais se o cliente tiver sorte. E ninguém pode dizer que o advogado está sendo desonesto. É essa a realidade no Brasil, criando uma motivação.

Você ficaria em dúvida de entrar com uma ação gastando R$ 3.500,00, podendo ganhar R$ 10.000,00? Entretanto, se gastando os mesmos R$ 3.500,00 você tivesse a chance de ganhar R$ 30.000,00 com certeza ficaria mais motivado.

A situação é delicada, tendo como tendência haver omissão de informações que prejudicam o cliente e a valorização de informações que podem vir a favorecer.

Dessa forma, a pessoa acredita na sua versão da história como a pura verdade. Só que para o juiz é apenas uma versão da história, sendo a versão apresentada pelo devedor, a qual irá receber a mesma credibilidade.

Otimismo nas demandas

Pesquisas acadêmicas concluíram que é esse otimismo é o principal obstáculo para a celebração de acordos.

A partir desses estudos, foi elaborada uma fórmula que prevê se a pessoa irá ingressar com a ação judicial.

A fórmula de Análise Racional da Litigância é:

Valor esperado da demanda (VED) = O valor envolvido (B) x multiplicado pela chance de vitória (V) – os custos sociais do processo (CS).

Assim, VED = (B x V) – CS.

Se o resultado for negativo, dificilmente entrará com processo judicial. Por outro lado, se o resultado for positivo, há motivação para entrar com a ação.

Além disso, quanto maior for o valor esperado da demanda, maior é a motivação.

Influência do advogado

Todavia, os estudos não pesquisaram sobre a influência do advogado nessa fórmula. O valor envolvido a pessoa já sabe desde o início, mas o advogado pode ampliar ou reduzir esse valor com seus fundamentos.

Dessa forma, o advogado irá analisar a chance de vitória de acordo com a lei e as decisões judiciais anteriores. Contudo, essas informações são desorganizadas e confusas, não existindo dados públicos organizados sobre os julgamentos. Há uma enorme assimetria de informações.

Além do mais, pode haver alguma informação importante que o advogado não teve acesso. Por isso, fica a critério do advogado usar seu instinto profissional, sendo influenciado pela sua motivação em pegar a causa.

Um advogado que receberá R$ 1.000,00 para defender algum cliente na justiça, mas que terá que investir R$ 1.500,00 dos seus recursos, não tem interesse em defender essa causa, mesmo que receba os mesmos R$ 1.500,00, ainda não será motivado.

Em média, o custo de uma ação para um escritório de advocacia varia entre R$ 1.000,00 e R$ 3.000,00 no Brasil. Para valer a pena, os honorários da ação tem que ser o dobro do custo, no mínimo.

Não havendo essa remuneração, o escritório de advocacia não terá interesse e não estará motivado.

Escritórios com bons estoques de processos irão regular o interesse pela média de honorários que vem recebendo, sendo não relevantes os custos para esses escritórios.

Por isso há advogados em início de carreira muito mais motivados com algumas causas do que advogados mais experientes. Entretanto, se a expectativa de honorários estiver abaixo do dobro do custo para o escritório dificilmente haverá um bom advogado para defender a causa.

Solução extrajudicial

Nesse caso, a tendência é a solução extrajudicial, sendo o acordo e a formalização em cartório. Não obstante, esse problema ficará sem solução.

Por outro lado, o advogado também tem motivos não financeiros para preferir a ação judicial.

Primeiro porque ao conciliar e resolver rapidamente, o cliente vai pensar que houve pouco trabalho e vai querer pagar menos honorários do que o contratado ou vai pagar a contragosto e sair reclamando do profissional, prejudicando sua reputação.

Segundo, porque o processo judicial é mais previsível. A resolução de disputa por mediação ainda é pouco conhecida da grande maioria dos advogados, bem como os grandes litigantes do Brasil não criam mecanismos eficientes para conciliação nas demandas.

Terceiro, acredito que mais relevante, é que para o advogado no processo judicial os pagamentos são feitos em conta judicial e os honorários são reservados ao advogado por alvará. Isso dá segurança ao advogado no recebimento do ordenado.

A população não tem como pagar à vista a maioria dos serviços, vindo a realizar o pagamento de forma parcelada.

Após a realização do serviço, muitos param de pagar. Portanto, o sistema jurídico incentiva o advogado a entrar na justiça.

Apesar de muito se propagandear a conciliação e mediação, a realidade é que o certame é que rende honorários. Há um fator que impacta igualmente na motivação da pessoa e do advogado: a solvência do réu.

Pessoas ou empresas que possuem riqueza são muito mais motivadoras de serem processadas judicialmente por seus adversários. Isso porque não há no Brasil mecanismos para cobrar dívidas e condenações de pessoas que não tenham dinheiro pra pagar, exceto no caso da pensão alimentícia.

Otimismo como causa no ingresso de ações

Por fim, uma reflexão sobre o argumento do Otimismo como causa no ingresso de ações. Isso não é uma explicação suficiente. A explicação do otimismo exagerado assim como o argumento dos baixos custos dos processos judiciais servem para colocar a culpa no grande volume de processos judiciais no cidadão.

De forma realista, ninguém vai ao Poder Judiciário por esporte ou diversão ou simplesmente porque é de graça. Só surge motivação ao ter vivido uma experiência de injustiça ao qual se busca uma reparação.

Ao se comparar os 100 maiores litigantes com as 100 maiores empresas se vê que muitas grandes empresas não aparecem entre os maiores litigantes, mesmo possuindo milhões de clientes.

Seriam os clientes de alguns bancos, companhias telefônicas, tão mais otimistas que os clientes de outras empresas?

O mesmo acontece com as 100 maiores cidades do país, onde nem todas aparecem como grandes litigantes.

Portanto, a causa de ingressar com ações judiciais não é o otimismo exagerado das pessoas. Uma explicação mais adequada pode estar no comportamento dos grandes litigantes: má prestação do serviço, produtos de má qualidade, desrespeito ao Código de Defesa do Consumidor, cobranças indevidas, etc.

Quem sabe pensar em regras para aumentar as condenações de empresas e governos que geram ações judiciais repetitivas? Constituir grupos de trabalho nos tribunais para responsabilizar e multar essas empresas e governos?

Este caminho parece ser o mais adequado.

É preciso mudar o sistema judiciário para valorizar a solução de conflitos através de acordos. Se trata de melhorar a comunicação das decisões judiciais relevantes para a população, de valorizar o trabalho do advogado que resolve as demandas com rapidez, de garantir ao advogado o recebimento dos honorários como é garantido a qualquer trabalhador, mesmo nas esferas administrativas e, por fim, se trata de criar desincentivos aos governos e empresas à massificação de casos.

Vale a pena entrar com um processo?

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Referências

  • ARENHART, Fernando Santos. A análise econômica da litigância: teorias e evidências. 2009. 118 p. Monografia (Curso de Ciências Econômicas). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.
  • PATRÍCIO, Miguel Carlos Teixeira. Análise económica da litigância. Coimbra: Almedina, 2005.
  • BREVES CONSIDERAÇÕES ACERCA DA ANÁLISE ECONÔMICA DO PROCESSO JUDICIAL. Grazielly Alessandra Baggenstoss.
  • O CAPITAL JURÍDICO E O CICLO DA LITIGÂNCIA. Ivo Teixeira Gico Jr.
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