Uberização e o Direito

A live teve como tema principal: Uberização no Trabalho.
O que é Uberização?
Rodrigo Marques inicia o bate papo relatando que quando falamos em inovação, podemos pensar em dois universos: inovação incremental e inovação disruptiva.
Na inovação incremental, inserimos alguma nova funcionalidade.
Mas na inovação disruptiva há uma mudança completa dos paradigmas. E é isso que estamos vivendo com a uberização.
No Direito, por exemplo, começamos a viver essa inovação dentro dos softwares jurídicos que utilizamos, bem como processos eletrônicos, audiências virtuais, entre outros.
Já na inovação disruptiva, vemos uma mudança completa de padrão. Rodrigo exemplificou com o aplicativo Uber.
O aplicativo virou principal opção, quando o comum era termos carros próprios ou usar táxis para nossa locomoção.
Olhando para o campo jurídico, tentamos arduamente regular as inovações, porém o sistema é lento. A inovação é muito mais rápida perante a regulação estatal.
Visão do Direito do Consumidor e Direito do Trabalho
Quando olhamos para a matéria de Direito do Consumidor, fazemos alguns questionamentos como: Estamos diante de uma relação de consumo? Quem é a parte mais fraca? Somos nós ou o motorista perante a empresa? O motorista teria uma relação de consumo com o aplicativo?
Se estamos diante da matéria Trabalhista, existe um vínculo empregatício, muitas pessoas defendem que sim, que quando se trata dos motoristas da Uber, temos um vínculo de trabalho.
Em contrapartida, outros cidadãos defendem não entender tal vínculo, tendo em vista que o profissional trabalha com muito mais liberdade.
Rodrigo Marques complementa que não há certo ou errado. Estamos em processo de construção, nos adaptando as inovações tecnológicas e como elas se posicionam diante do que já temos no mundo.
É o exercício completo de colocar o Direito que já existe em uma nova situação. Assim, precisamos pensar e recapitular para podermos concluirmos de forma justa.
Implicações da Uberização na vida das pessoas
Seguindo com nosso bate papo, Valdete apresenta uma visão diferente desta questão, ela acredita que é uma questão das pessoas adaptaram as implicações que essas alterações têm pro mundo do trabalho, vidas pessoais e para a sociabilidade.
Os relacionamentos no mundo virtual já fazia parte do dia a dia de todos, mas foi intensificado em razão da pandemia da Covid-19.
O home office, o qual já era uma realidade, foi tratado na Reforma Trabalhista como mais uma hipótese de não haver controle de horário e regulação do tempo de trabalho.Ou seja, já era comum, porém, a pandemia do Covid 19 acabou precipitando a migração da maioria dos profissionais que conseguem exercer sua função em casa, por meios virtuais.
Quando falamos em mobilidade, sempre ligamos a questão dos motoristas de aplicativo. Se tornou uma realidade para as empresas o uso da tecnologia e inovação para seus colaboradores.
A Uberização do trabalho é a representação do que está acontecendo no mercado de trabalho.
Valdete acredita que o uso da tecnologia impõe uma relação entre capital e trabalho, não significando alteração do fenômeno social.
Continuamos vivendo em uma sociedade em que as pessoas dependem do trabalho para viver e os empresários necessitam desta mão de obra para que seus negócios sobrevivam.
Essa questão de sociabilidade não se altera com o uso da tecnologia.
A forma como essas relações são vistas determina o alcance das pessoas que estão trabalhando por aplicativo ou uso de tecnologias, sendo dignas a esses direitos.
Trabalho fora dos padrões a partir da Uberização
No entanto, o contrário disso também acontece.
O uso da tecnologia permite uma exploração maior, exemplo disso são estudos que comprovam que motoristas de aplicativos trabalham em média 7 dias por semana, mais de 12h por dia.
Ou seja, estamos diante de pessoas que estão trabalhando fora dos padrões constitucionais de trabalho, onde o Estado nega que estes trabalhadores tenham os direitos mínimos de uma relação empregatícia.
Já temos decisões que reconhecem vínculo empregatício para motoristas de aplicativo. Todavia, há uma resistência diante dessas decisões, pois não são unânimes.
Tecnologia regulando a Jornada no Teletrabalho
Existem também decisões mais complexas para a regularização da jornada de trabalho para quem exerce na modalidade teletrabalho, onde a tecnologia poderia servir para facilitar este controle.
Segundo Valdete, não há dificuldade em regular tempo da jornada de trabalho para quem não trabalha presencialmente.
Desmaterialização do produto
Também abordamos o tema de desmaterialização dos bens de uso e as bases do Direito de Propriedade.
Rodrigo Marques relata que a mesma não é algo específica da tecnologia. A inovação só conseguiu viabilizar essa intenção de desmaterialização.
Sendo assim, se verificarmos a trajetória da humanidade, percebemos a mudança de comportamento nas gerações.
Em todos os períodos de instabilidade, a propriedade é segurança.
Isto quer dizer que você ter a sua casa, é sinônimo de segurança. Você ter o seu carro, é segurança e garantia de mobilidade e deslocamento.
A propriedade traz para a psicologia humana a ideia de controle e estabilidade.
Encarecimento dos bens
Contudo, a evolução está levando a humanidade a não ter mais essa necessidade de propriedade, afinal, ter propriedade é caro e dispendioso.
Isto não compõe mais os sonhos das pessoas. As novas gerações têm uma visão que pode-se usufruir de algumas coisas sem precisar ser o proprietário.
E com isto vem a ideia de desmaterialização dos produtos.
Assim funciona com o deslocamento, o qual também é desmaterializado.
O carro que é de sua propriedade, mas que até então você usava para sua vida pessoal, passa a ser um veículo de trabalho para ganhar dinheiro, podendo, inclusive, ser usado por outra pessoa para se deslocar.
Dinheiro real x Dinheiro virtual
Se observamos os Direitos Reais, é baseado em propriedade e o que se pode fazer com ela.
Todavia, atualmente não estamos mais pensando em propriedade, mas sim em uso.
Herança Digital
Atualmente o Direito das Sucessões trata até mesmo sobre os Direitos Digitais, ou seja, a herança digital.
Isto porque estamos em uma sociedade cada vez mais digital, que a partir de trabalho, investimento de tempo e até mesmo capital gerando bens imateriais e consequentemente gerando patrimônio digital.
Este patrimônio tem que ser regulado pelo Direito. Contudo, o Direito ainda olha para a propriedade material, estando em processo de compreensão de como será abordada a transição para o universo digital.
Valdete, por outro lado, acredita que estamos buscando legitimar a propriedade digital sob esse parâmetro da propriedade privada.
E por que isso? Porque a nossa sociedade é constituída a partir da noção de propriedade privada.
Transição para o mundo virtual
Acredita que estamos em um momento de transição, porque toda essa realidade digital que a tecnologia nos permite acessar vai alterar drasticamente não só as questões de Direito de Propriedade.
É necessário discutir não só o fato de como será migrado de propriedade material para digital, mas reformular ou rever o conceito de propriedade privada.
Não há dúvidas que há uma transição que não afetará só as questões dos Direitos Reais ou da regulação jurídica desses bens, mas sobretudo a forma de nos relacionarmos.
Rodrigo cita que existem espaços virtuais que as pessoas adquirem bens que já tem valor, ou seja, de algum modo já estamos nessa transição para a realidade virtual que muda afetos, a forma como enxergamos os outros, como nos relacionamos com as pessoas.
Novo modelo de sociedade
Toda essa linha de pensamento significa um novo modelo de sociedade. Pessoas que vão se relacionar com os filhos, colegas de trabalho, companheiros, de uma forma diferente.
Como fica a questão do convívio familiar se as nossas casas viram ambientes de trabalho? Como se regula a prevenção contra possíveis lesões à saúde e segurança no trabalho se o ambiente é a nossa própria casa?
Essas questões são reflexos do mundo virtual nas nossas vidas hoje, desde os relacionamentos até os ambientes de trabalho, lazer, entre outros.
Crianças 100% conectadas
Atualmente, temos crianças que brincam através de instrumentos digitais e não com outras crianças. Isso vai fazer delas ser humanos diferentes dos adultos de hoje, que quando eram crianças brincavam nas ruas ou com os vizinhos.
Temos uma sociedade que por essa lógica de supremacia em relação à propriedade privada a outros valores, nos atomiza, fazendo com que as pessoas fiquem em competição o tempo inteiro.
Isso nos cria uma dificuldade adicional para desenvolver algumas habilidades que são essenciais, como a empatia.
As novas tecnologias tem a tendência de potencializar essa característica de atomização porque estamos em frente a uma tela de computador.
Uberização da Advocacia
Rodrigo Marques considera nosso atual momento de uma modificação social profunda, onde cada vez mais teremos menos vínculos empregatícios e teremos mais autônomos. Mais pessoas fazendo a sua própria renda.
A tecnologia está permitindo isso.
Olhando para os operadores do Direito, sabendo o impacto social que criam: Querem isso? É algo saudável para a sociedade?
Se a resposta for positiva, deve-se ter cuidado para que a área de marketing seja bem utilizada.
Isto porque já existe uma robotização do marketing, onde advogados são compelidos a fazer conteúdos para estarem no mercado.
No entanto, isso é um erro!
Os advogados não tem a obrigação de estarem na internet para serem inseridos no mercado atual.
Rodrigo questiona: estamos dispostos a fazer essa troca? Se estivermos conscientes, vamos em frente. Caso a resposta seja negativa: cuidado, porque a precarização e toda essa exposição que a tecnologia causa tem um preço alto.
Valdete analisa a questão de uma forma diferente.
Considera que quando falamos em uberização, isto é uma relação de emprego. Não há alteração substancial.
A subordinação dos motoristas de aplicativo
Não há autonomia nenhuma para quem trabalha digitalmente, pelo contrário, os motoristas de aplicativo, por exemplo, são pessoas avaliadas pelo próprio aplicativo e pelos passageiros.
Não decidem rota, forma de pagamento, valor. Não podem trabalhar poucas horas porque não sobrevivem. São sujeitos absolutamente subordinados.
Para Valdete, quando se fala em uberização se fala em precarização. E na advocacia isto é muito grave, uma vez que os advogados são pessoas que defendem os direitos das pessoas.
Como podemos falar em precarizar a profissão das pessoas que, no modelo de sociedade que vivemos, o Direito é aquilo que diz o que pode ou não ser feito?
Desconstituição da Advocacia e Reconstrução da Advocacia no Digital
Isso quer dizer que são formas de desconstituição de uma profissão que é essencial para a sociedade.
Temos uma Constituição Federal que dispõe de respeito a dignidade e direitos sociais. Todavia, como teremos profissionais que tem a função de exercer as defesas desses direitos, sem eles mesmos terem?
Durante a pandemia, é comum relatos da precarização maior do trabalho, especialmente para advogadas mulheres, que estão dando conta de cuidar das suas casas, dos seus filhos e do trabalho. Estas estão exaustas.
Eduardo conclui que tem acompanhado a classe em contato com dezenas de escritórios e equipes. Que os aplicativos tem uma tendência a priorizar o trabalho individualizado e solitário.
O Advogado autônomo atua dessa forma, individualmente e sem equipe, e que pode ter períodos de bonança, mas que qualquer instabilidade, doença ou sazonalidade o advogado que atua sozinho sofre.
Por isso que a ADVBOX incentiva tanto o trabalho em equipe, a construção de bancas de advogados que atuem conjuntamente, pois isso fortalece a advocacia e permite uma maior estabilidade.
Há muitos aplicativos na área jurídica que fazem leilão de advogados e intensificam o aviltamento de honorários.
Esses aplicativos são responsáveis pela uberização da advocacia, e que a ADVBOX vai justamente no sentido contrário, de fortalecer os advogados para defesa mais sólida dos direitos da população.
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